A metamorfose de Roberto Carlos | Os 5 discos essenciais da fase de ouro
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Existe um momento na vida em que até o espelho parece perguntar: “E agora, meu filho, vai continuar fingindo que é o mesmo de ontem?”. Para Roberto Carlos, esse momento chegou entre 1968 e 1972, quando ele olhou pra própria história, pro cabelo alisado com escova, o “iê-iê-iê” adolescente, os carangos envenenados e as calças da moda, e decidiu mudar de roupa. Sim, mudar de roupa. Não só a roupa literal, mas o figurino da alma.
Acontece que, às vezes, a vida vira a esquina antes da gente. E foi isso que se deu com o Rei. Enquanto o Brasil ardia entre mudanças sociais, endurecimento político e uma juventude que já não era tão jovem assim, Roberto percebeu que a Jovem Guarda estava ficando pequena demais para caber seu coração, suas dores e suas melodias maduras. Era preciso respirar outro ar. Ir pra outra estrada. Dormir em outro travesseiro emocional. E quer saber minha opinião? Não? Mas vou dar mesmo assim, pois o blog é meu! 🤣 Roberto Carlos nunca teve a alma roqueira, ele nunca foi realmente rock’n’roll como o Tremendão Erasmo Carlos, o Brasa se aproveitou de um momento e “surfou” na onda. Muito bem, diga-se de passagem.
E aí, bicho… ele foi, mora?
E deixou cinco discos, NA MINHA OPINIÃO, que não são apenas álbuns: são portais. São as cinco chaves do armário da Nárnia sentimental que mora dentro de cada brasileiro que já se apaixonou, já levou um pé na bunda, já acelerou demais na estrada da própria vida, já chorou no ônibus ouvindo música e fingiu que era só alergia.
Se você acha que conhece Roberto Carlos, talvez só o tenha visto pela metade.
E se nunca ouviu esses cinco discos com atenção, prepare-se: você vai conhecer o homem por trás do mito, e não o contrário.
Então, respira fundo. Puxa a cadeira. Afrouxa a alma.
Vamos viajar de 1968 a 1972, em cinco anos em que um artista deixou de ser “O Ídolo” para virar simplesmente… o Rei Roberto Carlos.

1968 | O inimitável: quando Roberto Carlos quebrou o próprio molde
“O Inimitável” não é só um título; é um recado. Um chute na porta. Um bilhete deixado em cima da mesa dizendo: “Tô indo, mas eu volto diferente”.
Em 1968, Roberto abandona de vez a casa da Jovem Guarda, desliga a luz, dá aquele último olhar sentimental para o sofá gasto pela rebeldia juvenil e decide entrar num terreno mais sinuoso. O disco traz metais, grooves, arranjos com alma, brilho, inspiração… A Black Music começa a soprar no ouvido dele. É como se Roberto tivesse descoberto que dentro dele morava um certo swing, só que um swing de quem já amou, já viveu e já entendeu que o mundo não é só festa nas Jovens Tarde de Domingo.
A faixa que abre o álbum, “E Não Vou Mais Deixar Você Tão Só”, já entrega o jogo: não estamos mais lidando com o garoto d’O Calhambeque. Estamos diante de um homem olhando no espelho e dizendo: “Deixa eu te mostrar quem eu sou de verdade”.
É o momento em que a borboleta rompe o casulo, com estilo, brilho nos olhos…

1969 | Roberto Carlos: o primeiro passo com sapato social
Se 1968 foi o tapa na mesa, 1969 é o suspiro. É o andar mais calmo, mais elegante, mais cheio de sombras e luzes.
O disco de 1969 é um meio-termo saboroso, um lugar entre o “adeus ao jovem rebelde” e o “olá ao cantor adulto”. Roberto começa a medir a própria voz com cuidado de ourives. Surge aquela sonoridade mais macia, que a gente reconhece até hoje como DNA puro do Rei.
E aí vem As Curvas da Estrada de Santos.
Essa música é um portal emocional. É praticamente um filme num carro conversível que ninguém tinha, mas todo mundo queria ter. É Roberto mostrando que pode falar de dor sem cair na pieguice; que pode falar de queda sem perder a postura.
1969 é o ano do disco em que o artista aprende a andar com outra postura. Se tivesse espelho retrovisor musical, daria pra ver a Jovem Guarda ficando distante no horizonte.

1970 | Roberto Carlos: o nascimento do ícone do romantismo
1970 é quando Roberto sai da estrada e entra no palco com holofote emocional. É aqui que nasce o Roberto “adulto”, “elegante”, “refinado”, o homem que canta como quem abraça, que fala como quem suspira, que entrega sentimentos com cuidado de quem segura porcelana fina.
O Brasil já era outro. O público também. E Roberto entendeu antes de todo mundo que, se a vida muda, a música precisa mudar também. Em vez do rock juvenil, entram arranjos maiores, letras profundas, temas de gente grande: amor, perda, saudade, memória.
É o disco em que o Roberto cantor assume o lugar que o Roberto ídolo deixou vago.
É o “Eu cresci, e você também”.

1971 | Roberto Carlos: o disco em que o artista vira clássico
O meu álbum preferido do Rei, o disco de 1971 é aquela coisa: a gente coloca o disco pra tocar e pensa “Poxa, então essa é a voz definitiva dele”. É como se Roberto tivesse encontrado não apenas o tom certo, mas a persona certa, a alma certa, a roupa sonora certa.
Arranjado parcialmente nos Estados Unidos, o álbum tem uma precisão que quase dói de tão bonita. Os violinos entram como brisa quente de verão, a voz desce com elegância de vinho que respira há horas, e as letras… ah, as letras. São de adulto para adulto, com uma exceção e outra, confesso, de quem já viu coisa demais. De quem aprendeu a amar, perder, recomeçar e sabe que nada disso é simples.
1971 é o ano do disco para ouvir com calma, com tempo, com memória. Ele não grita. Não empurra. Ele convida. E quem aceita o convite nunca mais esquece.

1972 | Roberto Carlos: o ápice da transformação
Chegamos ao cume. À fase mais melancólica, mais madura, mais profunda do Rei.
O disco de 1972 é inteiro feito de carne viva. É o álbum mais confessional da sequência, talvez de toda a carreira. Aqui estão A Distância, Por Amor, Como Vai Você, O Divã… canções que não apenas contam histórias, mas sangram memórias. É a alma do artista colocada na vitrine com luz quente, sem filtro, sem armadura.
Se em 1968 ele rompeu o casulo, em 1972 ele voa.
Voando baixo, voando alto, voando triste, voando bonito.
É o disco que fecha o ciclo com chave de ouro envelhecido.
E, ironicamente, quando ele chega ao topo… já é outro.
A metamorfose completa (1968–1972): de ídolo a Artista
O que esses cinco discos constroem não é apenas uma discografia. É uma narrativa. Uma jornada. Uma transição que poucos artistas conseguem fazer com tanta elegância.
Roberto deixa de ser o símbolo juvenil de uma geração para se tornar o cantor de amor, de estrada, de memória, de saudade , uma figura adulta com voz que parece já nascer eterna.
O Roberto de 1972 não tem mais nada a ver com o Roberto de 1965, mas ambos estão vivos dentro de quem escuta.
Essa metamorfose não é linear. Não é uma escada. É mais como um carrossel emocional: cada disco dá uma volta no mesmo tema, mas com luz diferente, com cheiro diferente, com coração diferente.

O que esses álbuns realmente dizem
Não é uma análise técnica.
É uma leitura emocional do que cada disco representa dentro da transição:
1968 — O corajoso.
Diz: “Eu posso ser outro”.
1969 — O elegante.
Diz: “Eu posso crescer”.
1970 — O adulto.
Diz: “Eu posso sentir”.
1971 — O refinado.
Diz: “Eu posso ser clássico”.
1972 — O profundo.
Diz: “Eu posso ser eterno”.
Cinco álbuns.
Cinco versões do mesmo homem.
Cinco fotografias sonoras do Brasil que mudava.

E hoje? o que a gente faz com isso?
A gente escuta.
Com o coração aberto, com a cabeça descansada, com a alma pronta pra lembrar e esquecer ao mesmo tempo.
Numa época em que artistas mudam de estilo como quem troca imagem de perfil, Roberto nos mostra que a transformação verdadeira não é estética, é existencial.
Que crescer é inevitável.
Mas amadurecer… ah, amadurecer é escolha.
E Roberto escolheu.

Por que você precisa (re)ouvir essa fase?
Porque ela é a chave para entender:
– o artista;
– o homem;
– o Brasil;
– e o próprio tempo.
É como se, nesses cinco anos, Roberto tivesse virado historiador da alma humana sem querer ser. Ele pega sentimentos que todo mundo vive e devolve em forma de música, com cuidado, com perfume, com memória.
Ouvir Roberto de 1968 a 1972 é lembrar de quem você foi. De quem você é. E, talvez, de quem você nunca teve coragem de ser.
Se você ouvir esses cinco discos na sequência, sem pausa, sem olhar o celular, existe uma grande chance de:
- Lembrar de alguém que não devia.
- Mandar mensagem pra essa pessoa (não faça isso).
- Achar que está num filme que nunca foi gravado.
- Acreditar que sabe cantar Como Vai Você (você não sabe).
- Ter vontade de comprar um vinil do Roberto Carlos às 3h da manhã.
- E, claro… agradecer por existir música que cresce junto com a gente.
Roberto mudou.
E, de alguma forma, a gente mudou junto.
PS: Fiz uma live linda, celebrativa, de exaltação ao Roberto Carlos com meus queridos Alan James e Gustavo Montenegro. Assistam. Vale a pena!
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