Raul 80 anos: o maluco beleza que ainda perturba o sistema
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28 de junho de 2025. Se estivesse vivo, Raul Seixas estaria completando 80 anos. Mas a real é que Raul não precisou de 80, nem de 70, nem de busto em praça pública pra virar imortal. Ele fez isso na marra, na música, no delírio, na contramão da caretice e da covardia. E talvez por isso, continue mais vivo do que muito artista que ainda respira.

Raul foi o último dos alquimistas. Um Elvis tropical com alma de profeta e cabeça de adolescente revoltado. Um gênio livre, que fez da música sua religião e da contracultura sua morada. Um artista que preferia o riso ao ranço, a provocação à submissão, o delírio ao silêncio.
Mas que ninguém se engane: por trás do deboche, existia um pensador. Um sujeito que lia Nietzsche e Gurdjieff na mesma noite, que misturava Dylan com Luiz Gonzaga, que cantava sobre amor, política, liberdade e existência como quem joga uma bomba-relógio no colo da sociedade. E tudo isso com sotaque baiano, camisa aberta, dentes tortos e olhos acesos.
O legado não se engarrafa
Raul não é desses que cabem numa prateleira de clássicos. Ele é a prateleira inteira e ainda quebra uma ou duas no caminho. Foi marginal antes da MPB virar engajada. Foi rock’n’roll antes do BRock. Foi esotérico antes do Instagram místico. Foi um símbolo de resistência num tempo em que resistência era sinônimo de perseguição.
Nos anos 1970, enquanto o Brasil ardia sob a ditadura, Raul lançava discos que diziam, nas entrelinhas o que muita gente morria de medo de falar. Em plena censura, ele criou uma “Sociedade Alternativa”, onde o verbo era ser e o pecado era se calar. Um paraíso para os malucos, os desajustados, os que não se encaixavam,ou melhor, os que se recusavam a se encaixar.
Mas engana-se quem acha que Raul parou por aí.
Nos anos 1980, mesmo doente, enfraquecido, jogado de gravadora em gravadora, ele continuou gravando. Continuou provocando. Continuou existindo. Álbum após álbum, mostrou que sua arte era resistência viva. E encerrou a carreira em grande estilo, ao lado de Marcelo Nova, num disco que é quase uma confissão brutal e lindamente suja: A Panela do Diabo.

Ainda não acordamos
Raul dizia que “sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só… mas sonho que se sonha junto é realidade”. Talvez por isso ele nunca tenha sido só um cantor. Ele foi o catalisador de uma geração inquieta. E ainda é.
A juventude que hoje veste camisa do Raul sem saber o que foi o DOPS, que tatua “Tente Outra Vez” sem nunca ter ouvido Gita inteiro, ainda está, mesmo sem saber, vivendo o que ele previu: uma busca eterna por liberdade num mundo cada vez mais controlado por medos, algoritmos e caretices travestidas de opinião.
Raul continua sendo necessário porque o mundo continua dormindo.
E, cá entre nós, ninguém chacoalhava melhor o sono do Brasil do que aquele magrelo de riso debochado.
Salve Raul!
Hoje, aos 80 anos, Raul Seixas segue intocável no panteão dos gigantes da música brasileira. Mas, ao contrário de outros, ele não está lá em cima numa redoma inalcançável. Raul está nas ruas, nos bares, nas playlists, nas faixas pintadas em muros, nas frases que viram mantra e nas perguntas que nunca se calam.
Ele não foi herói. Nem vilão. Nem guru. Foi gente. Foi arte. Foi explosão.
E é justamente por isso que ele continua sendo tão nosso.
Então hoje, dia 28 de junho, a gente não celebra só o nascimento de um artista. A gente celebra o nascimento de uma ideia.
De um espírito.
De uma trilha sonora pra quem escolheu viver fora do script.
Salve Raul! Viva Raul! Raulzito é eterno.
📺 Acompanhe a homenagem comemorativa no canal Pitadas do Sal com Romero Carvalho. Uma viagem pela obra dos anos 1980 e um papo sobre o legado desse maluco beleza que ainda nos provoca.
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